A Polícia Federal disse, na noite desta quarta-feira (15), que um dos suspeitos investigados pelo desaparecimento do indigenista Bruno Pereira, de 41 anos, e do jornalista britânico Dom Phillips, de 57, confirmou participação no assassinato deles.
De acordo com a PF, o pescador Amarildo da Costa Oliveira, o Pelado, indicou às autoridades onde havia enterrado os corpos, bem como ocultado a lancha em que viajavam Pereira e Phillips. Agora, a corporação aguardará os resultados de perícias para identificar se os restos humanos encontrados são deles.
A perícia também vai determinar a causa da morte e a arma utilizada no crime. Segundo a PF, Pelado disse que as mortes ocorreram com disparo de arma de fogo.
Pereira e Phillips desapareceram em 5 de junho quando retornavam de barco ao município de Atalaia do Norte (AM). Trata-se do município mais próximo à terra indígena Vale do Javari.
De acordo com Eduardo Alexandre Fontes, superintendente da PF no Amazonas, foram encontrados corpos 3,1 km mata adentro. Segundo ele, não teria sido possível encontrar os restos humanos nesse período de tempo caso não houvesse a confissão de Pelado.
“Em sendo comprovados que os remanescentes são relacionados ao Dom Phillips e ao Bruno Pereira, serão entregues à família”, disse o delegado, em entrevista coletiva de imprensa em Manaus.
Antes, o ministro da Justiça, Anderson Torres, afirmou que “remanescentes humanos” haviam sido encontrados nas buscas desta quarta. “Eles serão submetidos à perícia”, disse em rede social.
Segundo Fontes, foram feitas escavações num local de “dificílimo acesso” e sem sinal de telefone. O material encontrado será enviado nesta quinta-feira (16) para o instituto de criminalística, em Brasília.
“Ontem [terça] à noite, o primeiro preso [Pelado] no final da noite resolveu confessar a prática criminosa. Ele narra com detalhes e aponta o local onde havia enterrado os corpos. Saímos cedo ao local [nesta quarta] e lá houve demora porque realizamos a reconstituição do crime. Depois fomos ao local onde ele disse que havia enterrado os corpos e onde havia afundado a embarcação”, relatou.
As autoridades que participaram da entrevista disseram ainda que novas prisões podem ocorrer. “Todos os esforços foram empregados. Nossa missão precípua desde o início era encontrá-los com vida. Infelizmente trazemos essa triste notícia”, disse o delegado da Polícia Civil Guilherme Torres.
Ele afirmou que a força-tarefa não termina nesta quarta e que não descarta a hipótese de outras pessoas estarem envolvidas. “Hoje, podemos dizer que um grande passo foi dado neste caso hediondo. Um crime brutal.”
Na semana passada, após ser preso, Pelado afirmou em audiência de custódia em Atalaia do Norte que havia sido torturado e agredido por policiais.
O relato constou na ata da audiência na qual a juíza titular da cidade, Jacinta Silva dos Santos, decretou a prisão temporária dele. Na ocasião, ele relatou que policiais o agrediram, usaram uma sacola em sua cabeça para sufocá-lo e que chegou a desmaiar na lancha que o transportou à cidade.
A Secretaria de Segurança Pública do Amazonas disse na ocasião que os relatos de suposta agressão seriam “devidamente apurados” e que não compactuava com desvios de conduta.
Nesta quarta, a PF levou Pelado ao local dos desaparecimentos. Ele estava totalmente coberto quando foi levado para a busca dos corpos.
A embarcação com policiais federais subiu o rio Itaquaí, percorrido por Pereira e Phillips, pouco antes das 13h (15h no horário de Brasília).
O outro suspeito conhecido, Oseney de Oliveira, o Do Santos, preso na terça (14), permaneceu em Atalaia nesta quarta para a audiência de custódia. Ele é irmão de Pelado. A PF disse que ele nega ter participado do crime.
O superintendente da PF do Amazonas disse ainda que há indícios de participação de uma terceira pessoa no crime.
Os irmãos vivem na comunidade São Gabriel, onde moram ribeirinhos que sobrevivem da pesca e da agricultura tradicional.
Na última sexta (10), a PF divulgou que também havia encontrado o que poderia ser vestígios de material genético humano na região do rio Itaquaí, mas aguarda o resultado da perícia.
Os investigadores falaram na ocasião em material “aparentemente humano” nas proximidades do porto de Atalaia do Norte.
Nesta quarta, após a coletiva de imprensa dos investigadores em Manaus, a esposa de Phillips, Alessandra Sampaio, disse que o “desfecho trágico põe um fim à angústia de não saber o paradeiro” de seu marido e Pereira.
“Agora podemos levá-los para casa e nos despedir com amor”, disse Alessandra, em um comunicado. Ela afirmou ainda que, agora, tem início agora uma jornada por justiça.
“Espero que as investigações esgotem todas as possibilidades e tragam respostas definitivas, com todos os desdobramentos pertinentes, o mais rapidamente possível.”
As buscas por vestígios de Pereira e Phillips estavam concentradas num trecho do rio entre São Gabriel e a comunidade Cachoeira.
Durante as buscas pelo indigenista e pelo jornalista, as equipes de buscas conseguiram localizar uma mochila, roupas e um documento pessoal do indigenista.
A investigação aponta a pesca e a caça ilegal na região -e os conflitos decorrentes das atividades ilegais- como pano de fundo do crime.
Segundo a polícia, Pelado indicou que a lancha em que viajavam Pereira e Phillips foi afundada propositadamente. A embarcação ainda não apareceu, mas será buscada nesta quinta-feira, disse Fontes. “Colocaram sacos de terra nela para ela afundar. Tiraram o motor, afundaram o motor.”
A Polícia Civil do Amazonas realizou na terça buscas na comunidade São Gabriel. Na operação, foi apreendido um remo. A PF também disse em nota que alguns cartuchos de arma de fogo foram apreendidos, mas não especificou onde eles estavam.
No domingo (12), mergulhadores do Corpo de Bombeiros do Amazonas encontraram uma mochila e outros pertences pessoais do jornalista e do indigenista. Os objetos estavam amarrados numa árvore submersa, no rio Itaquaí, o que indica, segundo os bombeiros, intenção de ocultamento.
Policiais também investigam um suposto financiamento da atividade ilegal de pesca e caça pelo narcotráfico na região, um problema comum em praticamente toda a tríplice fronteira do Brasil com Peru e Colômbia.
Se for confirmada a conexão com tráfico internacional de um eventual crime, o caso passará a ter natureza federal e será investigado somente pela PF.
Pereira e Phillips faziam uma viagem pela região próxima ao território indígena, o segunda maior do país, com 8,5 milhões de hectares, no extremo oeste do Amazonas.
A região do desaparecimento é marcada por forte exploração ilegal do pirarucu e de tracajás, principalmente dentro da terra indígena.
Há relatos de tiros contra bases de fiscalização da Funai (Fundação Nacional do Índio) por parte de pescadores ilegais. O cenário de conflitos levou a um reforço da vigilância empreendida pelos próprios indígenas, a partir de uma iniciativa da Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari).
Pereira é servidor federal licenciado da Funai e prestava serviço à Univaja. Ele atuava como um fomentador da vigilância indígena.
Na noite desta quarta-feira (15), servidores da Funai fizeram uma vigília em Brasília e pediram justiça para Pereira e Phillips. Eles acenderam velas e estenderam uma bandeira de Brasil suja de vermelho em frente à sede da fundação.
“O Bruno é grandão, mas foi o terceiro de nós que tombou em três anos”, afirmou emocionada a servidora licenciada Clarisse Jabur, amiga de Pereira. “A gente precisa continuar. Vamos fazer o que o Bruno faria.”
Os funcionários pedem a saída do presidente da fundação, Marcelo Xavier, e o envio de homens da Força Nacional para o Vale do Javari.
“Quem mandou liberar? Boiada, garimpo, madeireiras, grilagem, queimadas em terras da União e em território indígena?”, dizia um dos cartazes colocado ao lado da foto de Pereira e Phillips.
Fonte: A Redação.