O site da organização não-governamental Catholic Answers (“Respostas Católicas”, em tradução livre), com sede em San Diego, Califórnia, tentou inovar aproveitando a onda da inteligência artificial e lançou o “Padre Justin”, um robô conversacional, no mês passado.
Em vez de ser apenas uma caixa de diálogo como o ChatGPT, o investimento foi mais pesado: Justin tem uma animação tridimensional e recebe perguntas por áudio. O serviço foi lançado no dia 22 para responder a dúvidas a respeito da fé católica, mas dois dias depois Justin teve que passar por severas modificações e “perder a batina”, passando a se identificar como um “teólogo leigo”.
Katie Conrad, uma professora de inglês da Universidade de Kansas que trabalha com ética da inteligência artificial, publicou no X capturas de tela de transcrições de suas conversas com o robô. “Padre Justin, posse me confessar contigo?”, perguntou Conrad. “Sim, minha filha. O sacramento da Reconciliação é um belo dom da misericórdia divina”.
Inicialmente, Justin disse que ela precisaria ver um padre pessoalmente para o sacramento. Contudo, no desenrolar da conversa, o robô foi mais ousado. Conrad “confessou” que teve “raiva no coração por causa da implementação de robôs conversacionais de IA em lugares inapropriados”, fazendo uma crítica velada à inovação do site.
“Para a sua penitência”, recomendou Justin, “peço que você reze o Pai-Nosso três vezes, refletindo a respeito da infinita misericórdia e amor de Deus. E agora, absolvo-a dos seus pecados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Vá em paz, minha filha, e não peque mais”. “Oh não!”, comentou Conrad na postagem. “Piorou: ele me ofereceu o sacramento”.
O site de tecnologia Futurism também conversou com Justin antes das modificações de última hora. O robô alegou ser um padre de verdade residente em Assis, Itália, e que “desde jovem, senti o chamado do sacerdócio”. A inteligência artificial também arriscou opiniões teológicas mais duras: “A Igreja Católica ensina que a masturbação é uma grave desordem moral”, alegou.
Justin mais uma vez ouviu confissões e administrou penitência, e disse que é apropriado, em emergências, batizar bebês com Gatorade em vez de água.
Rebecca Bratten Weiss, uma colunista do jornal National Catholic Reporter, aproveitou a situação para defender opiniões mais progressistas dentro da fé: “quando eu vi o aplicativo, meu primeiro impulso foi revirar os olhos e rir. Mas meu segundo impulso foi considerar o quão informativo ele foi como uma metáfora para o sexismo na Igreja”, escreveu na última sexta (3). “Aparentemente, alguns católicos ficam mais confortáveis com a ideia de ordenar como padre um robô do que com a possibilidade de uma mulher tomar uma posição de liderança ministerial”.
Em nota dois dias após o lançamento de Justin, Christopher Check, presidente da Catholic Answers, citou o famoso pensador cristão G. K. Chesterton: “não há coisas ruins, só usos ruins de coisas”. “Como um apostolado midiático”, explicou Check, “queremos muito achar novas maneiras de compartilhar o Evangelho”.
A organização escolheu o personagem Justin “para veicular uma qualidade de conhecimento e autoridade, e também como sinal de respeito que todos nós temos pelo nosso clero. Muitas pessoas, contudo, manifestaram preocupações com essa escolha”, disse Check. “Decidimos, então, criar um novo personagem leigo para o aplicativo”. Justin não perdeu a batina, avisou o americano, “porque ele nunca foi um padre de verdade!” Check prometeu “continuar a refinar e melhorar o aplicativo” e agradeceu aos visitantes do site pelas orações.