Lula continua líder, mas bateu no teto: completou nove meses estacionado no patamar de 40% das intenções de voto.
O Datafolha atribuiu-lhe 43%, ontem. Em dezembro tinha 48%, segundo o instituto, que trabalha com margem de erro de dois pontos percentuais.
Lula não tem ido às ruas, como fez em todas as eleições anteriores, e só fala para audiências controladas.
Passaram-se quinze anos desde a última vez em que caçou eleitores nas calçadas, para pedir que votassem nele. Se sentia acossado pelos efeitos do caso Mensalão, precisava se reeleger na presidência e, se possível, “eliminar” do mapa político alguns adversários incômodos — como os do antigo PFL, logo transformado em DEM e, hoje, sócio do União Brasil.
O mundo era outro. Vladimir Putin, por exemplo, não mandava tropas invadir a Ucrânia, apenas cortava o fornecimento de gás em meio ao gélido inverno, alegando que estava baixo o preço contratado e pago pelos ucranianos.
Lula é caso raro, em múltiplos sentidos. Exemplo: é candidato único de um mesmo partido há quatro décadas seguidas.
Sua primeira vez foi na primavera de 1982. A banda atravessou devagar pela Rua das Flores, calçadão central de Curitiba, abrindo caminho para um grupo com faixas e cartazes improvisados de um partido desconhecido — o PT tinha apenas dois meses de registro na Justiça Eleitoral.
No meio da comitiva estava um barbudo sorridente. Seguiram para o comércio na Boca Maldita, onde a tradição curitibana recomenda que se fale mal de tudo e de todos, num exercício de liberdade. Na estridência daquele ajuntamento duas novidades: o prelúdio do ocaso da ditadura e a candidatura de um líder metalúrgico ao governo de São Paulo.
Hoje, Lula é o candidato presidencial na posição mais confortável, com 17 pontos de vantagem sobre o segundo colocado, Jair Bolsonaro. Mas a diferença encolheu, era de 26 pontos em dezembro.
Essa queda de nove pontos em doze semanas, tendo-se como referência do Datafolha, é coerente com a tendência predominante na profusão de pesquisas eleitorais.
Nela é possível entrever a dificuldade crescente de Lula para sustentar a diferença que o mantém isolado na liderança há nove meses.
Reflete, também, a melhoria na posição do adversário Bolsonaro, que ocorre de forma gradual, mas persistente, assim como a alta da inflação.
Foi captada no eleitorado paulista, em meados de fevereiro, quando o PoderData constatou uma redução (de 14 pontos para 9 pontos) na vantagem regional de Lula sobre Bolsonaro.
Se não há crescimento expressivo de Bolsonaro, tem-se indícios relevantes de que ele ganha fôlego, e vai confirmando “viabilidade eleitoral”, como dizem os especialistas em marketing político. Em português legítimo, era “cachorro morto” só na aparência.
A má notícia para Lula na pesquisa divulgada ontem está na confirmação de outra tendência: a mudança relevante no comportamento crítico do eleitorado mais pobre em relação ao governo.
Efeitos do auxílio (R$ 400 mensais) eram previsíveis na faixa de renda de até dois salários mínimos. Porém, a velocidade detectada nas últimas cinco semanas surpreendeu governo e oposição.
Bolsonaro avança no segmento mais pobre do eleitorado, onde a renda mensal familiar máxima é de dois salários mínimos (R$ 2,4 mil).
É um grupo numeroso, dono de cerca de 48 milhões de votos, há nove meses sustenta Lula na liderança isolada, e unânime, das pesquisas — a diferença oscila em torno de 35 pontos, dependendo da metodologia usada sondagem.
Há dez dias, o Ipespe apurou uma melhoria (oito pontos) na avaliação do governo, extensiva ao candidato à reeleição, nesse segmento de eleitores, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
É notável que, observada a coerência nos resultados das diferentes pesquisas, Lula e Bolsonaro somem dois terços das intenções de votos.
No entanto, não significa consolidação do quadro a seis meses da eleição.
O cenário é de instabilidade. Há um terço de votos disponíveis aos demais candidatos e, como se registrou na pesquisa BTG/FSB, mudança de candidato é possibilidade admitida tanto por eleitores de Lula (18%) quanto de Bolsonaro (16%).
Ambos, lembra-se no Datafolha conservam significativa rejeição: o candidato a reeleição é recordista (55%) e o ex-presidente vem em seguida, bem acima (37%) dos outros adversários.
Fonte: Veja.com