Esquerda da América Latina tem relações estreitas com o Irã

Por Milkylenne Cardoso
9 Min Read

Diante do ataque sem precedentes do Irã a Israel no fim de semana, a maioria dos governos de esquerda na América Latina divulgou comunicados sem criticar Teerã.

O governo Lula foi criticado por ter emitido uma nota pedindo “máxima contenção” no Oriente Médio, mas sem condenar explicitamente o Irã, que realizou o ataque em resposta a um bombardeio (atribuído a Israel) ao consulado iraniano na Síria que matou um importante líder militar do regime dos aiatolás.

A ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela também não
condenou Teerã e ainda classificou o ataque iraniano no fim de semana como um “resultado
do genocídio na Palestina e da irracionalidade do regime israelense, bem como
da inação das Nações Unidas”.

Essa resposta aos eventos de sábado (13) é fácil de entender:
muitos dos governos de esquerda latino-americanos têm laços com o Irã. O Brasil
integra os Brics, que no ano passado aprovaram a entrada dos iranianos no
bloco.

Entretanto, países vizinhos, incluindo as três ditaduras de
esquerda da América Latina, têm relações ainda mais estreitas com Teerã, o que
gera preocupações a respeito da segurança da região. Confira abaixo algumas
dessas ligações:

Venezuela

As relações do chavismo com o grupo terrorista libanês Hezbollah, apoiado pelo Irã, já foram amplamente documentadas.

Um relatório de 2020 do think tank americano Atlantic
Council destacou os laços de figuras importantes do chavismo, como o ex-chefe
da contrainteligência militar venezuelana Hugo Carvajal Barrios, e o Hezbollah.

“A localização estratégica da Venezuela na América do Sul e
na encruzilhada do Caribe dá ao Irã e ao Hezbollah a capacidade de diminuir sua
desvantagem geográfica em relação aos Estados Unidos. Para esconder essa
relação, [Hugo] Chávez e depois o regime de Maduro forneceram identidades
duplas para oriundos do Oriente Médio, construindo uma rede clandestina que
fornece inteligência, treinamento, dinheiro, armas, suprimentos e know-how para
os regimes de Maduro e [do ditador sírio Bashar al-]Assad”, destacou o
documento.

A parceria do chavismo com o Hezbollah se estenderia a
guerrilhas colombianas envolvidas com o tráfico de drogas na região, destacou o
Atlantic Council.

Entretanto, também há uma grande relação “direta” de Caracas
com Teerã. Este ano, as Forças de Defesa de Israel (FDI) denunciaram que o Irã
envia armas para a Venezuela por meio de rotas aéreas e marítimas, incluindo o
drone Mohajer-6, que pode transportar até quatro mísseis ar-terra e que a
ditadura de Maduro exibiu recentemente num desfile militar em Caracas.

As FDI também relataram que navios iranianos com mísseis
foram identificados na costa noroeste da Venezuela. Em março, uma delegação do
Irã esteve em Caracas para fazer um balanço da “relação bilateral” entre as
duas ditaduras.

“Com a chegada da Revolução Bolivariana em 1999 [ano em que
Hugo Chávez chegou ao poder], iniciou-se a construção de uma frutífera relação
bilateral que se fortaleceu ao longo dos anos pela resistência patriótica de
ambos os povos em defesa da sua soberania e autodeterminação, celebrando para esse
fim diversos acordos nas áreas de petróleo, petroquímica, gás, assuntos
científicos, tecnológicos, agrícolas, acadêmicos, comerciais e culturais”,
informou o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela em nota.

Bolívia

Outro governo de esquerda com fortes laços com a teocracia
iraniana é a Bolívia, relação iniciada no governo de Evo Morales (2006-2019) e
que se mantém na gestão do seu ex-apadrinhado político (e atual desafeto) Luis
Arce.

Em julho de 2023, o ministro da Defesa boliviano, Edmundo
Novillo, esteve em Teerã e assinou com o governo da república islâmica um
memorando de entendimento nas áreas de defesa e segurança.

Diante da repercussão e do mistério sobre o acordo, ele detalhou dias depois que La Paz estava interessada em drones de tecnologia avançada, que supostamente seriam usados nas fronteiras do país no combate ao narcotráfico e ao contrabando e na vigilância militar.

Entretanto, entidades judaicas na Argentina manifestaram
preocupação com a possível utilização militar dessa tecnologia contra outros
países.

Recentemente, o jornal argentino Clarín informou que o
Mossad, serviço de inteligência de Israel, mudou recentemente sua sede regional
do Chile para a Argentina e o foco das suas investigações tem sido as relações
próximas da Bolívia com o Irã.

Cuba

Assim como a Venezuela, Havana busca se aproximar de Teerã
para criar uma parceria que ajude as duas ditaduras a se fortalecer diante das
sanções impostas pela comunidade internacional.

Em dezembro, o ditador de Cuba, Miguel Díaz-Canel, esteve no
Irã e na ocasião os dois regimes assinaram sete memorandos de entendimento e
documentos de cooperação em diversos setores, incluindo ciência e tecnologia,
saúde, agricultura, energia e mineração, comunicações e medicina.

A relação entre os dois regimes vem desde a época de Fidel Castro – que disse que a parceria poderia deixar os Estados Unidos “de joelhos” – e os dois países integram a lista do governo americano de países patrocinadores do terrorismo.

No ano passado, as duas ditaduras falaram em formar uma coalizão
para combater “os comportamentos coercitivos dos Estados Unidos e dos outros
países ocidentais”.

Nicarágua

Contornar sanções também está na pauta da colaboração da
ditadura de Daniel Ortega com os aiatolás, mas a parceria vai além disso.

No ano passado, o jornal americano The New York Times
revelou que os dois países discutiram um reforço na cooperação militar durante
uma reunião do ministro das Relações Exteriores iraniano, Hossein Amir
Abdollahian, com oficiais superiores do Exército da Nicarágua.

“Esta aproximação é, até agora, a atitude mais frontal do
regime para consolidar uma aliança militar com inimigos dos Estados Unidos. Não
há assistência militar de qualquer relevância entre o Irã e a Nicarágua neste
momento”, afirmou o líder oposicionista nicaraguense Félix Maradiaga, em
entrevista ao site Confidencial.

Argentina

O governo libertário de Javier Milei condenou enfaticamente o ataque do Irã a Israel, postura que seus antecessores peronistas não adotavam.

No ano passado, a Justiça argentina reabriu um processo
contra a ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), devido a um suposto pacto
que seu governo teria feito com o Irã para acobertar a participação de Teerã
nos dois maiores ataques terroristas da história do país sul-americano: um
atentado em Buenos Aires que matou 85 pessoas em 1994, na sede da Associação
Mutual Israelita Argentina (Amia), e o ataque à Embaixada de Israel dois anos
antes, que havia deixado 29 mortos.

Um promotor que investigava o caso Amia e denunciou
Kirchner, Alberto Nisman, foi encontrado morto na sua casa em janeiro de 2015.

Na semana passada, a Sala II do Tribunal Federal de Cassação Criminal atribuiu ao Irã a responsabilidade pelos dois atentados, concluindo que foram praticados pelo Hezbollah “sob a inspiração, organização, planejamento e financiamento de organizações estatais e paraestatais subordinadas” ao Irã.

A decisão abre caminho para que Estados e parentes das vítimas processem Teerã em cortes internacionais.

Fonte: www.gazetadopovo.com.br

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