O Equador está vivendo uma enorme onda de violência e criminalidade dois dias após confirmar a fuga de José Adolfo Macías, líder da facção Los Choneros, uma das principais organizações criminosas do país, ligada ao cartel de Sinaloa.
Macías, que é conhecido como “Fito” e considerado como uma das pessoas mais perigosas do país, lidera a facção de Los Choneros desde o ano passado, quando o antigo líder do grupo criminoso foi morto na Colômbia. Segundo informações das autoridades equatorianas, a Los Choneros controla algumas das principais rotas do tráfico de drogas no país e vive em conflito contra outras organizações.
Esta foi a segunda vez que Macías escapou da prisão no Equador. Em
2013, ele conseguiu escapar de um presídio de segurança máxima localizado na
cidade equatoriana de Guayaquil, no entanto, três meses depois ele foi
recapturado e preso.
A fuga de Macías não só desencadeou uma crise na segurança pública do Equador como também uma série de reações dos presos, que realizaram rebeliões para “exigir” que não fossem realizadas transferências ou que fossem feitas atualizações nos controles das unidades prisionais.
Desde segunda-feira (8), um dia após as autoridades confirmarem a fuga de Macías, o Equador vivencia uma série de ataques com explosões, sequestros de policiais, fugas de presos, invasão a veículos de comunicação e instituições públicas, que deixaram a população local em pânico e desafiaram a autoridade do governo federal.
Devido a esses incidentes, que se intensificaram na segunda, o presidente
do país, Daniel Noboa, decretou no mesmo dia um estado de exceção em todo o
Equador, que terá inicialmente uma duração de 60 dias. Com a decisão do
mandatário, ficaram suspensos os direitos à liberdade de associação,
inviolabilidade de domicílio, inviolabilidade de correspondência nos presídios
e a liberdade de trânsito entre 23h e 5h da manhã. Além disso, a medida permitiu
também que as Forças Armadas do país, em apoio à polícia, controlassem as
prisões.
Noboa afirmou que a medida visava dar todo o “respaldo político e
legal às forças de segurança do Equador” para enfrentar os grupos
“narcoterroristas que pretendem intimidar o governo e a sociedade”. Ele lembrou
que seu governo não iria “negociar com terroristas” e que trabalhará para
“devolver a paz a todos os equatorianos”.
Com a medida do presidente em vigor, os criminosos decidiram dar
uma resposta ainda mais violenta ao Estado equatoriano. Nesta terça-feira (9), o
país vivenciou uma série de novas explosões, que atingiram desde veículos até a
residência do presidente da Corte Nacional de Justiça, Iván Saquicela, na
capital do país, Quito.
Outros explosivos foram detonados em cidades como Esmeraldas,
Cuenca, Loja e na província de Chimborazo.
Foi em Chimborazo que se registrou a fuga de 32 presos, entre os
quais Fabricio Colón Pico, que havia sido detido na semana passada logo após a
procuradora-geral do Estado, Diana Salazar, o mencionar no planejamento de uma
suposta conspiração contra sua vida. Colón Pico é considerado o líder regional
de outra facção criminosa o país, conhecida como Los Cubanos.
Durante as rebeliões nas prisões, circularam vídeos nos quais
pessoas vestidas com uniformes de agentes penitenciários eram vistas lendo
mensagens dos presos onde pediam ao presidente Noboa para que “parasse com suas
ações de controle” dentro das unidades prisionais.
O Serviço Nacional de Atenção Integral a Adultos Privados de
Liberdade e Adolescentes Infratores (SNAI) disse que durante as rebeliões houve
a retenção de agentes penitenciários.
A situação se agravou ainda mais no país sul-americano pela tarde, quando um grupo de criminosos armados e com os rostos cobertos decidiu invadir o canal de TV TC Televisión, do qual o Estado equatoriano é dono de uma parte, na cidade de Guayaquil.
No local jornalistas e funcionários do veículo de comunicação
foram feitos de reféns. Os criminosos interromperam a programação, que estava
ao vivo, e colocaram um explosivo em frente a uma câmera. Logo depois, foi
possível escutar tiros e gritos dentro do estúdio da TV. Informações da mídia
local apontam que um dos reféns ficou ferido.
A polícia informou por meio de sua conta no X (antigo Twitter) que conseguiu recuperar o controle do edifício e apreender alguns dos criminosos que invadiram o local.
Simultaneamente ao ataque realizado contra a emissora, criminosos armados invadiram a Universidade de Guayaquil e causaram pânico entre estudantes e professores, que se trancaram nas salas de aula aterrorizados com o que estava acontecendo naquele momento.
Os ataques em Guayaquil passaram a ocorrer de forma generalizada, diversos vídeos veiculados nas redes sociais mostravam como a população corria nas ruas e tentava se esconder em locais um pouco mais seguros. Comércios e instituições públicas fecharam suas portas com medo de tamanha violência. A polícia confirmou ainda o sequestro de quatro policiais em diferentes pontos da cidade.
Em Quito, a polícia ordenou a evacuação do palácio presidencial de Carondelet, instantes depois de que o presidente Noboa promulgou um outro decreto, no qual ordenou às Forças Armadas do país intervir para neutralizar as organizações criminosas que classificou como terroristas.
Em seu novo decreto, Noboa declarou a existência de um “conflito armado interno” no Equador e identificou 23 facções criminosas como “organizações terroristas”. Entre elas, estão a Los Choneros, Los Cubanos, Los Águilas, Los Lagartos, Los Latin Kings e Los R7.
O prefeito de Quito, Pabel Muñoz, disse que tanto a sua cidade
quanto o país estavam atravessando “uma crise de segurança sem precedentes”,
razão pela qual anunciou que a segurança seria reforçada em áreas críticas e
nos serviços públicos. Ele também solicitou ao governo federal “a militarização
das instalações estratégicas da cidade para garantir seu funcionamento”.
Por sua vez, o Ministério da Educação do Equador ordenou que as
atividades escolares fossem realizadas virtualmente em alguns estabelecimentos
de ensino, incluindo os que estão localizados mais próximos das prisões.
Disputa pelo tráfico e controle dos presídios
Além da tentativa de enfraquecer o poder público, a crise de segurança no Equador causada pelas organizações criminosas está também sendo intensificada pela disputa que existe entre as facções pelo controle do tráfico de drogas.
A maior parte das facções criminosas do país sul-americano tem conexões com cartéis do narcotráfico internacional localizados no México e na Colômbia. As facções também lutam pelo controle dos presídios, que desde o ano de 2021 registraram mais de 400 mortes por causa dos enfrentamentos entre organizações rivais.
A ministra do Interior do Equador, Mónica Palencia, disse em um
comunicado que o governo do país está trabalhando “pela recuperação de um
estado de paz” e que “neste momento as prisões são o centro de atenção
específico”.
Especialistas consideram que os atos violentos realizados nesta terça-feira foram uma declaração de guerra das facções ao Estado e à sociedade equatoriana, e que o governo deve agir com “firmeza e inteligência” para restabelecer a “ordem e a segurança” no país.
Em entrevista ao jornal El Universo, Julio César Cueva,
advogado especialista em direito penal, disse que as organizações criminosas do
Equador declararam guerra “não ao presidente” do país, mas sim aos “cidadãos”
nesta terça. Ele observou que o Estado equatoriano deve “entrar com toda a
força legítima que tiver” para combater as facções e restabelecer a normalidade
do país.
Segundo o advogado, o Equador vive uma crise generalizada porque ainda conta com a infiltração de grupos criminosos em algumas instituições estatais. Para Cueva, é necessário que o governo dê uma resposta abrangente contra o crime organizado neste momento, dando indultos para policiais e militares que estiverem realizando as operações.