O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou dar um golpe para permanecer no poder após ser derrotado por Lula (PT) em outubro de 2022. É isso o que pensa a maioria dos brasileiros, 55%, segundo a mais recente pesquisa do Datafolha. Discordam dessa leitura 39% dos ouvidos.
Bolsonaro é alvo de investigação da Polícia Federal, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, que vem revelando detalhes sobre uma trama golpista que envolveu reuniões nos palácios do Planalto e da Alvorada, a confecção de uma minuta com os procedimentos a envernizar a intentona e a tentativa de trazer a cúpula das Forças Armadas para o plano.
Muito do roteiro saiu da turbulenta delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, que voltou à cadeia após a revelação de gravações pela revista “Veja” em que ele se disse pressionado pela PF a falar o que não sabia e faz críticas a Moraes.
Especialistas em direito se dividem acerca da tipificação da conduta de Bolsonaro, de resto abertamente golpista em diversos momentos de sua carreira pública, particularmente na sistemática campanha contra o sistema eleitoral brasileiro — que já lhe rendeu a perda de direitos políticos até 2030.
Não souberam se posicionar sobre o tema 7% dos 2.002 entrevistados pelo Datafolha em 147 cidades brasileiras nos dias 19 e 20 de março. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos para mais ou menos.
Sem surpresa, bolsonaristas são refratários à tese de que o líder quis dar um golpe. Não acreditam nisso 73% de seus eleitores no segundo turno de 2022 e 75% dos que se dizem ou muito ou algo próximo de seu ponto no espectro político.
Acreditam nesse intento, em ambos os grupos, 19%. Como a opinião é expressa ao mesmo tempo da autodeclaração, é de se supor que esses entrevistados concordam com a ideia de que um golpe de Estado seria aceitável.
Na pista contrária, 87% dos eleitores de Lula e 86% dos petistas creem na intenção golpista do ex-presidente, ante 19% e 11%, respectivamente, que não. Os neutros no barômetro ideológico do Datafolha acreditam mais (48%) que Bolsonaro queria dar um golpe do que o contrário (39%).
Em segmentos mais amplos, os mais ricos são mais taxativos de que Bolsonaro não buscou uma ruptura institucional: 53% não creem nisso. Entre os mais instruídos, o índice fica em 48%, o mesmo apontado entre os evangélicos, grupo associado ao bolsonarismo.
Atuação de Moraes no 8 de janeiro
Símbolo da ação da Justiça na apuração e julgamento dos envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023, o ministro do Supremo Alexandre de Moraes tem sua conduta no caso avaliada de forma mista pelos brasileiros. Segundo o Datafolha, 37% aprovam seu trabalho, ante 33% que o reprovam.
Outros 24% dos 2.002 ouvidos consideram que a condução do magistrado no episódio é regular. Moraes tornou-se um dos mais polêmicos ministros da história recente da corte, devido a sua ação em casos envolvendo o radicalismo populista de direita que emergiu com a chegada de Bolsonaro à Presidência, em 2018.
Ele é o relator do inquérito das fake news, que apurava inicialmente ataques pessoais a ministros do Supremo, o que gerou críticas: o magistrado estaria julgando um caso em que é vítima potencial. A corte rejeita tal colocação.
O inquérito acabou se tornando um guarda-chuva sobre diversos atos associados ao golpismo bolsonarista, que hoje é apurado na questão da trama para manter o ex-presidente no poder e no caso do 8/1 — no qual 145 pessoas já foram condenadas.
Para críticos do ministro, é um poder excessivo e discricionário, e aliados do ex-presidente dizem que ele o persegue. Há também erros formais apontados na sua ação. Seus apoiadores veem no trabalho de Moares um esteio da defesa da democracia em um momento crucial da história recente do país.
Com isso, o trabalho judicial se vê, como de resto virou praxe no Brasil das últimas décadas, em meio a disputas políticas. O próprio presidente Lula fez uma opção clara de aliança com o Supremo em seu governo, como forma de contrabalançar o peso de um Congresso em que é minoritário.
Sem surpresa, a esfera bolsonarista é mais crítica do que a petista ao ministro. A pesquisa mostra que, entre eleitores do segundo turno de 2022 do ex-presidente, 60% consideram o trabalho de Moraes ruim ou péssimo, ante apenas 14% que o aprovam.
É a colocação em números dos gritos de “Xandão ditador” usuais em atos do grupo, em que o ministro é alvo preferencial e sua ação no 8/1, vista como abusiva contra os mais de 1.400 denunciados pelo Ministério Público.
Já naqueles que elegeram Lula, a aprovação é de 62% e a reprovação, de meros 10%. Os que avaliam a condução como regular se equiparam: 24% entre eleitores do petista, 21% entre os do rival.
Quando o cruzamento é feito a partir da matriz ideológica do entrevistado, os números se equivalem nos extremos, mas nos 21% da população que se dizem neutros a avaliação dos procedimentos de Moraes é dividida em um terço para cada item: 30% aprovam, 29% acham regular e 33%, reprovam.
Nos estratos populacionais relevantes, a melhor avaliação, 42%, se vê na classe média que ganha de 5 a 10 mínimos e nos maiores de 60 anos. Já reprovam mais o trabalho de Moraes quem tem curso superior (45%), os mesmos que ganham de 5 a 10 mínimos (47%) e os mais ricos (43%).