Com a expectativa de um ciclo de afrouxamento monetário mais “raso” nos Estados Unidos, o fluxo estrangeiro tende a ficar longe de economias emergentes, segundo André Raduan, sócio-fundador da Genoa Capital.
Sem pressões inflacionárias e com crescimento do PIB americano esperado entre 2,5% e 3% para este ano, acima do que se prevê para a maioria das economias em desenvolvimento, os EUA vão continuar drenando a liquidez de outros mercados.
“Com taxa de juro real mais atrativa, a nossa visão desde o início do ano era que viria pouco fluxo, o investimento tem ficado na economia americana”, disse Raduan, ao participar de evento do Bradesco BBI.
“O emergente virou o pato feio dessa história. Os EUA estão vivendo uma revolução tecnológica, e o Brasil ficou meio sem demanda dos investidores.”
As necessidades de emissões do Tesouro dos EUA para financiar o seu déficit gigantesco vão puxar ainda mais recursos, disse Raduan. Pior seria, contudo, se houvesse uma recessão no radar.
Raduan comentou que a melhora expressiva que se viu na inflação americana veio da oferta e ganhou a contribuição da melhora do mercado de trabalho por causa da imigração. O gestor acredita que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) inicie seus cortes a partir de junho.
“A diferença em relação a outros ciclos é que nos parece que a oferta está se estabilizando, e o juro terminal fica um pouco mais alto.”
Política monetária mais restritiva
Ainda há um efeito de política monetária mais restritiva a se materializar nos EUA, segundo Carlos Woelz, sócio-fundador da Kapitalo. No período de taxas baixas, as companhias aproveitaram para se financiar num custo menor, enquanto as famílias tinham reservas dos estímulos recebidos durante a pandemia.
“O balanço das empresas e do consumidor é bom, isso está diluindo o efeito da alta de juros e jogando mais para frente. Já houve um efeito que ficou para trás. Mas o que surpreende é o quão pouco impacto teve no crescimento da economia”, afirmou o gestor.
Woelz disse haver sinais de fraqueza do mercado de trabalho americano e, somando o aperto que as empresas vão perceber no fim do ano, ao se refinanciar, a direção é para o corte de juros. “O tamanho não sei. A gente normalmente sabe como começa um ajuste de política monetária, mas é difícil prever como termina. Espero que seja mais raso que o normal.”
Para Felipe Guerra, sócio-fundador e executivo-chefe de investimentos (CIO) da Legacy Capital, o cenário internacional é de realocação de risco sob a perspectiva de cortes de juros. “Pode trazer um fluxo adicional para a bolsa e em paralelo um ambiente positivo para commodities.”
No xadrez global, a China, por sua vez, tem enfrentado transformações significativas ao mesmo tempo que encara o envelhecimento da população e menor urbanização, disse Raduan. O crescimento pautado no setor imobiliário agora dá lugar a novos investimentos industriais, com a produção batendo recordes em cima da pauta da transição energética.
“A China é o cara que tem custos mais baixos mesmo, é competitiva, está jogando até na questão da [queda] da inflação para o resto do mundo, com exportações a preços mais baixos.”
O gestor disse estar otimista com o curto prazo, com um crescimento perto do intervalo almejado pelo governo, entre 4,5% e 5%, mas, para frente, ele disse ver uma desaceleração por conta da reação de outros países que tendem a impor tarifas de importação. “No limite, vai precisar ter uma moeda mais desvalorizada. E, para frente, tem um crescimento potencial mais baixo.”
Woelz enfatizou o papel da China como grande exportadora de deflação para o mundo, algo que talvez esteja subestimado. Ele disse estar, contudo, otimista na margem com a economia, não tanto pelo crescimento, mas porque o governo lidou com o colapso do setor imobiliário muito melhor do que se esperava.
Guerra acrescentou que, conjunturalmente, também ficou mais otimista com o gigante asiático, com o ciclo industrial pegando tração, mas, certamente, haverá taxação de bens importados por países europeus.