Desde os ataques terroristas
do Hamas realizados contra Israel em outubro de 2023, a internet chinesa – que
é fortemente controlada pelo regime comunista liderado por Xi Jinping – ficou
inundada de comentários e materiais antissemitas.
Um artigo publicado pelo
jornal americano The Washington Post no último dia 8 apontou que
diversos comentários disparando o ódio e informações falsas sobre os judeus estão
circulando normalmente pelas redes do país asiático, que vivem sob um grande
aparato de censura que bloqueia qualquer assunto que seja considerado
“sensível” ou contrário ao regime de Pequim.
Aaron Keyak, vice-representante
dos EUA para o combate ao antissemitismo, disse em entrevista ao jornal
americano que o aumento dos comentários de ódio contra os judeus conta com o
total aval do regime de Xi.
“Sabemos que a internet
chinesa não é livre, essa é uma decisão consciente do governo chinês de
permitir que esse tipo de retórica [ataques antissemitas] aumente
consideravelmente”, disse.
Para Keyak, o que se observou após os ataques de outubro contra Israel “foi uma mudança drástica na mídia social dentro da China”. Segundo ele, “o antissemitismo se tornou mais desenfreado, mais livre”.
“Eles [a China] veem a disseminação
do antissemitismo como uma ferramenta de promoção do seu interesse
nacional”, disse Keyak, lembrando que “isso é um problema para os Estados
Unidos e para qualquer um que se preocupe com o bem-estar dos judeus em
qualquer lugar, pois [o antissemitismo] se espalha”.
Em dezembro de 2023, quando
estava no Brasil, o representante americano disse ao jornal Folha de São
Paulo que o antissemitismo estava sendo utilizado como uma “ferramenta
diplomática” pelo regime chinês.
“O
maior problema de usar o antissemitismo como uma ferramenta diplomática para
impulsionar seus objetivos de política externa é que os judeus acabam se
machucando no final”, declarou.
A afirmação de Keyak foi repreendida pela ditadura comunista chinesa, que por meio de sua embaixada no Brasil, chamou as acusações de “maligna”. No entanto, a veiculação de material falso sobre judeus na mídia controlada do país asiático não é algo novo.
Em maio de 2021, uma emissora
estatal do regime chinês veiculou em sua conta no X (antigo Twitter) um vídeo contendo
informações falsas de que os judeus dominavam “os setores financeiros, os meios
de comunicação e a internet” dos EUA e controlavam a opinião da sociedade americana.
O material foi veiculado em um
contexto onde Israel estava realizando operações na Faixa de Gaza e foi
considerado pela embaixada israelense no país asiático como um “flagrante antissemitismo expresso por um meio
de comunicação oficial chinês”.
“As
afirmações feitas no vídeo são racistas e perigosas e não deveriam ser usadas
por um meio de comunicação que se preze”, escreveu na época a embaixada de
Israel no X.
Na
entrevista concedida à Folha, Keyak lembrou que esse tipo de
informação falsa é frequentemente utilizado em países totalitários.
“Fortalecer a teoria da
conspiração de que os judeus controlam o sistema financeiro, a mídia, os
políticos, leva as pessoas a acreditar que não há como responsabilizar seus
governos, porque são controlados por uma força externa. Do ponto de vista de
países e indivíduos que não amam a democracia, isso é atraente”, disse.
Yaqiu Wang, diretor de
pesquisa da Freedom House para a China, Hong Kong e Taiwan disse em entrevista
ao Post que na China, “o governo criou um ambiente onde é fácil o
conteúdo antissemita prosperar” neste momento.
Uma matéria da Al Jazeera
publicada em novembro divulgou alguns dos comentários que são veiculados
livremente pelas redes sociais que são controladas pelo regime de Xi.
A emissora do Catar encontrou desde comentários de pessoas exaltando o Holocausto do regime nazista, onde escreveram: “É realmente culpa do Pequeno Bigode [Hitler]. Se ele tivesse queimado todos eles [os judeus], não teríamos tanto problema”, até publicações onde se afirmava que os judeus haviam se beneficiado de guerras: “Nas guerras europeias, você verá a sombra dos judeus ganhando dinheiro, como abutres”.
O site estatal Voz da
América constatou em dezembro que os ataques antissemitas veiculados na
internet chinesa ainda estavam em alta. No perfil da embaixada de Israel no
país, a equipe do site encontrou diversos comentários de ódio.
Apesar disso, a embaixadora
israelense na China, Irit Ben-Abba Vitale, disse em entrevista ao site que a
circulação desse tipo de conteúdo estava começando a ser removido da internet
local.
De acordo com informações do
jornal israelense The Jerusalém Post, as relações entre a China e Israel
têm passado por altos e baixos nos últimos tempos. Apesar de manter
compromissos econômicos com os israelenses, os chineses não condenaram
especificamente o Hamas pelos ataques terroristas de outubro nem o
classificaram como um o grupo ou organização terrorista.
Tal decisão ocorreu porque o
regime de Pequim mantém fortes relações diplomáticas com os países árabes, segundo
o The Jerusalém Post. As relações entre a China e esses países são tão
fortes que nem mesmo as denúncias de que o regime chinês estaria violando os
direitos humanos dos uigures, uma minoria étnica muçulmana que vive na região
de Xinjiang, foi condenada pela Liga Árabe, que visitou o local em junho do ano
passado e negou que estaria ocorrendo um genocídio naquele lugar.
O presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, chegou a justificar na época que as ações da China na região faziam parte do “combate ao terrorismo” e que não tinham “nada a ver com violações dos direitos humanos”.