Os grandes blocos pró-europeus – populares, sociais-democratas e liberais – reafirmaram sua maioria no Parlamento Europeu nas eleições deste domingo (10), embora com menos assentos do que as pesquisas apontavam e do que tinham no mandato anterior, enquanto a direita demarcou seu espaço por toda a Europa.
A última atualização de dados eleitorais ainda provisórios divulgada nesta segunda-feira (10) mostram que os grandes partidos políticos europeus conseguiram 402 dos 720 assentos que compõem o Parlamento Europeu, confirmando uma tendência de crescimento da ala mais conservadora.
Os números publicados pelo Parlamento Europeu às 10h30 (horário local, 5h30 de Brasília) apontam que o Partido Popular Europeu (PPE) teria obtido 185 assentos, enquanto a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) seria o segundo grupo, com 137 cadeiras. Os liberais, por sua vez, conseguiriam 80 representantes.
Em comparação com a situação no Parlamento Europeu antes das eleições, o PPE ganharia mais nove assentos, enquanto os sociais-democratas perderiam dois representantes. Os liberais, por sua vez, ficariam com 22 eurodeputados a menos.
Já o Conservadores e Reformistas (ECR) aparece agora com 73 assentos, e o Identidade e Democracia, com 58. Eles são os grupos mais à direita no espectro político no cenário do Parlamento Europeu, e esperam que partidos nacionais com ideias semelhantes, mas que ainda não têm uma “família” política europeia, entrem em negociações para engrossar suas fileiras nas próximas semanas.
Composição do Parlamento Europeu
Ao todo, sete grupos compõem a atual legislatura do Parlamento Europeu. Esses segmentos podem começar a negociar acordos já nesta segunda e exigem um mínimo de 23 deputados de sete países-membros. Eles podem permanecer ou desaparecer, e novos partidos podem ser adicionados ou perdidos.
A nova configuração do Parlamento com a ascensão da direita ainda é uma incógnita. Os grupos podem tentar se unir em uma única aliança para coordenar esforços, aumentar sua influência e obter acesso a mais recursos e financiamento.
A composição dos grupos também pode mudar ao longo da legislatura, mas os blocos que estarão em vigor na primeira sessão plenária poderão usar seu peso em assentos para obter, por exemplo, vice-presidências da instituição.
A União Europeia realizou eleições para renovar as 720 cadeiras de seu Parlamento até este domingo. Cada país realiza eleições locais, onde os cidadãos votam nos partidos nacionais. Uma vez eleitos, esses parlamentares se juntam a um dos sete grupos da União Europeia.
Os grupos são segmentados da seguinte maneira:
Partido Popular Europeu (centro-direita): atualmente com 176 eurodeputados, é considerado o grupo majoritário do Parlamento, possuindo uma base sólida de membros alemães, poloneses e romenos. Fez alianças com os socialistas e liberais na última legislatura e defendeu pautas climáticas e contra imigração na Europa;
Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (centro-esquerda): 2º maior grupo do atual Parlamento Europeu, com 139 assentos. Possui forte representação dos socialistas espanhóis, liderados por Pedro Sánchez e defende a justiça social, equidade e combate ao desemprego;
Renovar a Europa (centro-direita): atualmente o 3º maior grupo no Parlamento Europeu, com 103 parlamentares. É liderado pelo partido Renascença, do presidente da França, Emmanuel Macron e defende, entre outras coisas, pautas sociais, crescimento econômico e sustentabilidade;
Grupo dos Verdes: 4ª maior força no Parlamento, possui 72 assentos. O grupo saiu fortalecido nas últimas eleições de 2019 apoiado na causa climática e os protestos massivos ao redor do mundo.
Reformistas e Conservadores Europeus (direita): 5º maior grupo do Parlamento, com 70 deputados oriundos de 15 países da UE. A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, é a grande figura do bloco, que prevê um aumento no número de eleitos;
Identidade e Democracia (direita): atualmente possui 49 assentos e é o 5º maior grupo do Parlamento Europeu. Este grupo tem deputados de nove países, a maioria deles do partido italiano Lega, do Rassemblement National (França) e da AfD (Alemanha). Entre os focos da aliança estão a criação de empregos e crescimento aos país, aumento da segurança e combate à imigração ilegal;:
Esquerda Unitária Europeia (esquerda): focado em direitos trabalhistas, justiça econômica e social, o grupo possui 35 deputados atualmente.
Crescimento da direita associado à situação política dos países-membros
Os conservadores e nacionalistas foram os grandes vencedores das eleições deste domingo, em um reflexo das tendências de crescimento que experimentaram em vários países-membros nos últimos anos, como a Itália, e como termômetro do que está por vir nas próximas eleições nacionais, como no caso de França e Alemanha, dois países de grande influência política.
Emmanuel Macron, mandatário francês, anunciou um ato inesperado e arriscado de dissolver a Assembleia Nacional logo após os primeiros resultados serem divulgados.
Isso porque o partido oposicionista Reunião Nacional, do candidato Jordan Bardella e de Marine Le Pen, obteve cerca de 31,5% dos votos, mais que o dobro conquistado pelo partido do presidente, o Renascimento, mostrando um crescimento da direita no país.
A medida tomada por Macron ocorre em meio a uma perda significativa de apoio interno nos dois últimos anos de seu segundo mandato presidencial: o mandatário já perdeu maioria no parlamento francês e, apesar das eleições para o Parlamento não influenciarem diretamente na política francesa, serve como um “termômetro” do que está acontecendo no país.
Por isso, o presidente decidiu testar o apoio popular de seu partido Renascimento e aliados em novas eleições parlamentares marcadas para 30 de Junho e 7 de Julho.
Enquanto isso, na Alemanha, o partido social-democrata SPD, do chanceler Olaf Scholz, também sofreu uma dura derrota no Parlamento Europeu, a pouco mais de um ano das eleições gerais no país, ficando logo atrás do partido de direita AfD, que aproveitou o descontentamento popular com o governo e se tornou a segunda maior força política vencedora.
O partido mais votado foi o democrata-cristão CDU, da ex-chanceler Angela Merkel e atualmente o maior da oposição ao governo, com 30,3% dos votos e 29 cadeiras das 96 que a Alemanha tem no Parlamento Europeu.
A Alternativa para a Alemanha (AfD) ficou com 15 cadeiras, ganhando seis em relação à última eleição europeia, em 2019, e 15,6% dos votos. Já o SPD ficou com 14 assentos – seis a menos que em 2019 – e 15,1% dos votos.
Essa perda de assentos da aliança de Scholz, formada pelo SPD, os Verdes e o Partido Liberal, representa um revés de quase 30% em relação às eleições europeias de 2019 e se mostra como um risco para o atual governo alemão, que pode deixar o poder nas próximas eleições.
Poderes do Parlamento Europeu
O Parlamento Europeu, considerado o órgão legislativo da União Europeia, tem funções específicas dentro do bloco, ficando responsável por questões legislativas, orçamentais e de supervisão.
Entre as atribuições estão a adoção de legislação, juntamente com o Conselho da UE, com base em propostas da Comissão Europeia; a decisão sobre acordos internacionais; e análise do programa de trabalho da Comissão, convidando-a a propor legislação.
Um outro poder é o de eleger o presidente da Comissão Europeia, cargo de importância no bloco que atualmente é ocupado pela alemã Ursula von der Leyen, que tenta a reeleição.
Von der Leyen disse nesta segunda-feira (10) que está com “a porta aberta” para novos pactos a fim de conseguir um novo mandato, depois de ter se aproximado de socialistas e liberais para reeditar uma maioria no Parlamento Europeu.
Ele deu essas declarações junto ao líder da União Democrata Cristã, Frederich Merz, quando perguntada sobre uma possível recusa em trabalhar na próxima legislatura com o partido conservador nacional Irmãos da Itália, legenda da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.
A política democrata-cristã alemã afirmou, entretanto, que no processo de reeleição para a Presidência da Comissão, “não falamos com partidos nacionais, mas com grupos no Parlamento Europeu”.
“Depois de um primeiro passo, outros podem se seguir, mas agora tudo isso está nas mãos dos grupos de trabalho, com os chefes de governo e de Estado e com o grupo parlamentar do Partido Popular”, acrescentou.
O partido de Meloni, sobre o qual Von der Leyen foi questionada, era membro do grupo Conservadores e Reformistas (ECR), um grupo à direita do PPE. Os resultados provisórios dão ao PPE, que inclui os democratas-cristãos, 185 dos 720 assentos do Parlamento Europeu.
Novo cenário no Parlamento traz impactos para o Brasil
A renovação do Parlamento Europeu, com a ascensão da direita, traz alguns impactos indiretos para o Brasil, principalmente no que envolve o agronegócio.
Isso porque são os representantes do órgão legislativo que escolhem quem assumirá a presidência da Comissão Europeia, órgão executivo responsável por defender os interesses gerais da UE, mediante a apresentação de propostas legislativas e a execução da legislação, das políticas e do orçamento da UE.
Também atua como a voz de todos os países do bloco nas instâncias internacionais, designadamente nos domínios da política comercial e da ajuda humanitária.
Historicamente, a UE se mostrou protecionista no setor da agricultura, estimulando os produtores locais. No entanto, o bloco sofre uma pressão de parte das forças políticas para alterações nesse sentido, visando reduzir subsídios fornecidos aos agricultores, em estímulo a uma abertura comercial.
Com o crescimento da direita, essa intenção poderia crescer, o que beneficiaria o Brasil. Por outro lado, uma parcela mais conservadora defende cada vez mais que os tratados comerciais ocorram dentro do bloco, diminuindo a possibilidade de acordos na área com o governo brasileiro.
A forma como as relações comerciais entre Brasil e UE serão guiadas vão depender da nova força majoritário no Parlamento e da escolha do novo nome à frente da presidência da Comissão, que deve continuar nas mãos de Von der Leyen, que depende de novos acordos políticos para governar.
Outro ponto a ser analisado em relação ao Brasil é a regulamentação do acordo de livre comércio estudado entre a UE e o Mercosul.
Para analistas políticos, apesar do Parlamento Europeu não ter força suficiente para decidir sobre o tratado – todos os países-membros devem aprovar a adesão- o bloco deve manter as negociações paralisadas.
O fato do governo brasileiro, liderado por Lula da Silva, não ter qualquer alinhamento ideológico com essa força crescente no Parlamento Europeu reforça o argumento de que o acordo Mercosul-UE não deve sair tão cedo do papel.